Análise | Death Stranding – O inóspito e fascinante mundo de Hideo Kojima

 

Death Stranding é um daqueles jogos que aquecem qualquer discussão sobre vídeo games. Desde seu anúncio, o primeiro projeto de Hideo Kojima após a sua sua saída da Konami alimentou o imaginário de seus fãs e de curiosos. Claro, muito devido ao mistério adotado pelo desenvolvedor desde o inicio, sem fazer a miníma questão de explicar do que se tratava o jogo, mesmo que estivesse muito claro o que poderíamos esperar: um genuíno e verdadeiro jogo de Hideo Kojima. E para o bem ou para mal, isto é Death Stranding.

 

Um mundo sem conexão

 

Sam Porter é um entregador, a figura mais importante desse mundo inóspito, tomado por seres que transitam entre a realidade dos vivos e dos mortos. Esses seres são chamados de BTs e o contato com humanos podem causar explosões a nível nuclear, podendo destruir cidades inteiras em segundos. O aparecimento desses seres foi devido a um evento conhecido como Death Stranding. Desde então, as pessoas se isolaram nas poucas cidades restantes e em refúgios espalhados no que um dia foi conhecido como os Estados Unidos. Os entregadores tem a missão de transitar de lugar a lugar, atendendo a pedidos e levando suprimentos para diferentes localidades. Em uma entrega que dá errado, Sam presencia uma explosão que dizima uma cidade inteira, tendo como sobreviventes apenas ele e um estranho bebê, que vive dentro de uma capsula. Conhecido como ”BB”, esse bebê ao se conectar com um ser humano, ajuda Sam a detectar os BTs, tornando-se indispensável para a criação de rotas e estratégias para chegar em seu destino. E é com esse novo companheiro que Sam recebe a missão de reconectar o país novamente.

Tudo parece muito confuso e sem sentido, mas as coisas vão ficando mais claras desde o primeiro minuto de jogo. A história que é contada em forma de capítulos, tem um excelente ritmo, e nunca joga em cima do jogador informação demais e nem de menos. Por mais complexa e aparentemente complicada que a trama seja (e é!), tudo se encaixa de forma natural e bastante satisfatória durante o gameplay. A jornada de Sam é incrível, e a Kojima Productions nos entrega um dos enredos mas únicos e originais dessa geração.

 

 

Um mundo perigoso

 

Explicar o conceito de gameplay de Death Stranding é difícil, porque  é muito mais do que aparenta, ao mesmo tempo que ele é exatamente o que parecer ser. Você deve ir em vários locais do mapa fazendo entregas, abastecendo refúgios e cidades enquanto conecta cada ponto a uma única rede, para que o país possa se unir novamente. Pode parecer chato e monótono, mas é extremamente engajador e por muitas vezes é sim muito divertido. É preciso  traçar a melhor rota, gerenciar muito bem sua carga e seus equipamentos, já que todo o caminho percorrido por Sam é repleto de desafios, regiões difíceis de se transitar e cheias de inimigos, sejam eles humanos ou não. O jogo te oferece uma infinidade de ferramentas e opções para te auxiliarem  durante a campanha, tornando as  entregas de Sam mais interessantes e abrindo excelentes possibilidades para lidar com todos os obstáculos que aparecerem pela frente. A proposta de jogo é muito bem definida, indo na contra a mão da maioria das produções AAA do mercado, não só em sua jogabilidade, mas também no seu conceito de mundo aberto, sendo estes dois dos seus grandes méritos. Há muito o que fazer aqui além da aventura principal, muito o que explorar e muito o que descobrir, com conteúdo suficiente para te ocupar por horas e horas.

Com uma proposta muito bem definida de narrativa e gameplay, Death Stranding tem o seu maior e mais significante acerto em sua abordagem do conteúdo multiplayer. Suas ações dentro desse universo impactam não só a sua jornada, mas a de outros jogadores. Uma corda colocada por você no topo de uma montanha pode estar presente no mesmo local no “mundo” de outra pessoa, a ajudando na travessia. Uma estrada construída com seus recursos pode facilitar não só a sua vida, mas as de outros jogadores. A construção desse espaço e o bom funcionamento dele depende da cooperação de cada um que passar por ali. Você ainda pode deixar itens e veículos em vários pontos do mapa para o uso coletivo. O jogo tem uma espécie de rede social, onde você ganha e distribuí curtidas pelas boas ações. As curtidas funcionam como agradecimento e ver que sua contribuição ajudou alguém é incrivelmente satisfatório.

 

 

Um mundo tecnicamente perfeito

 

Um dos grandes atrativos de Death Stranding é a presença de vários rostos famosos de Hollywood. Nomes como Norman Reedus (Sam), Mads Mikkelsen (Cliff), Lea Seydoux (Fragille), Margaret Qualley (Mama) e até o cineasta Guilhermo Del Toro (Deadman) estão presentes no jogo. Ainda temos a participação de várias figuras  como o apresentador e comediante Conan O’Brien e o diretor do filme Baby Drive, Edward Wright. Todos foram seus próprios modelos de suas versões digitais, retratados com extrema fidelidade e com uma tecnologia de captura e expressões faciais impressionantes. Os cenários tem grande variação de ambientes, todos muito detalhados e fascinantes. Você vai se pegar inúmeras vezes parando e contemplando o cenário, ficando várias vezes imerso nesse inóspito e incrível mundo criado por Kojima.

A imersão aqui é maior ainda devido ao trabalho sonoro, desde os sons ambientes à trilha sonora feita com muito capricho pelas mãos de Ludvig Forsell. Existe também uma seleção de músicas que tocam em momentos pontuais do game, com canções de grupos como Low Roar, Bring Me The Horizon, Major Lazer e os escoceses da banda CHVRCHES, tendo inclusive faixas compostas especialmente para Death Stranding.

 

Um mundo feito de alguns tropeços

 

Goste ou não, Hideo Kojima é um dos desenvolvedores mais criativos da industria. Sua nova obra possui mais do que nunca uma assinatura muito forte de seu criador, que teve total liberdade para criar exatamente o que queria criar. Isso implica em muitas qualidades como as citadas acima, mas também trazendo consigo algumas “manias de Kojima” não tão agradáveis assim. Por mais que Death Stranding se mantenha em um bom ritmo durante a maior parte do jogo, alguns momentos são bastante cansativos e extensos demais. Alguns trechos que  deveriam ter cargas emocionais muito grandes terminam com diálogos mal escritos e por muitas vezes até vergonhosos.

Grande referência no que diz respeito a luta contra chefes, Kojima trás alguns bons embates em Death Stranding, mas fica devendo bastante em parte deles. Mesmo que não seja o foco principal do game, faltou um pouco mais de tempero em algumas das lutas. Pequenas coisas incomodam, como a falta de opção de travar a mira no inimigo, resultando em alguns combates desengonçados. Algo que seria uma grande mão na roda quando você precisar lidar com BTs carregando mais de 100kg nas costas.

 

 

Um mundo que precisa ser conhecido

 

Death Stranding é uma jornada criativa, singular e inesquecível. É a expressão de liberdade de um desenvolvedor que pôde colocar em prática todas as suas idéias e vontades nesse projeto, por mais estranhas, geniosas e nem sempre tão boas quanto ele imaginou. Porém, a ousadia e a paixão colocadas aqui fazem desse um dos jogos mais originais e fantásticos de 2019. Com uma proposta muito bem definida, com uma boa narrativa e um mundo maravilhosamente cativante, o primeiro trabalho de Hideo Kojima com sua nova equipe é certamente um dos marcos dessa geração.

 

Death Stranding está disponível para Playstation 4 e tem previsão de lançamento para PC na metade de 2020.