Por que você DEVE jogar System Shock?
Um dos jogos mais influentes da indústria
Legitimidade para atribuir e definir padrões, que são repassados de tempo em tempo em outras obras, é a mais clara e limpa definição do que é um ”clássico”. E System Shock é um clássico. Neste querido ano teremos o lançamento de um remake completo do jogo original! Excitante, não?? Mas pera… tem muita gente que nem conhece o jogo.
Para aqueles em dúvida de ”o que é System Shock??”, já me permito em mandar a frase mais comum que você ouvirá por aí dos fãs: ele é o papai de jogos como Deus Ex, Bioshock, Dishonored, Prey e futuros jogos como Deathloop. Impressionante, não? Como pode um jogo de 1994, ter tanta influência em jogos recentes?
Novamente, System Shock nascia em 1994 pelas mãos da talentosa equipe da Looking Glass Studios. Algumas das mentes mais brilhantes da indústria de vídeo-games estariam desenvolvendo sua carreira por lá. Carregado de influências da época, o título revolucionário se impulsionaria em temáticas sci-fi, que dominavam o fim da década de 80 e início de 90. Seja nos filmes, literatura ou HQs, System Shock arranca um pedaço de variadas fontes e aplica em algo novo.
O estabelecimento do ”immersive sim”
Antes de tudo, que tal uma pequena e breve aula de História sobre a década de 90, para os games? Em especial, 1994 foi um ano curioso. Neste mesmo ano tínhamos lançamentos gigantes como Super Metroid, DOOM II e até mesmo Final Fantasy VI. Que ano poderoso!
Chega a ser impressionante pensar em como System Shock poderia ter feito tanto sucesso em meio a tantos gigantes intimidadores. Não havia nada igual a ele na época. Mesmo havendo claras e óbvias inspirações na série de jogos ”Ultima” (o vovô dos Immersive Sims), o título da Looking Glass ainda se distanciava muito de parâmetros da época.
Difícil causar uma primeira impressão com um gênero praticamente novo num mercado que começava a estabelecer suas primeiras raízes, de jogos ”tendenciosos” e ”lucrativos”. Pense bem, essa era a época dos jogos de luta! Época que vimos o nascimento de diversos ”clones” de DOOM e inúmeros JRPGs e RPGs.
Mas uma coisa que System Shock fez bem para atrair jogadores foi suas duas inspirações principais: Blade Runner e Neuromancer.
Um pouco de ”narrativa” cyberpunk
Pensa comigo e imagine: você é uma pessoa, no auge de sua adolescência, ou até mesmo um jovem adulto, vivendo a transição da década de 80 e 90. Essa é a mesma época em que filmes como Blade Runner brilhavam por aí (por mais que flopado nas telas), Neuromancer era rapidamente devorado por entusiastas do gênero e jogos de tabuleiro eram comprados aos montes.
Some isso a outra coisa: você é apaixonado por vídeo-games. Você teria que se contentar com uma cópia de Snatcher (feito pelo nosso querido Kojima), e ainda por cima, torcer para que houvesse um cursinho de japonês por perto, pois a versão em inglês só iria chegar entre 94-96. Então, é… as opções de jogos se limitava a apenas os table-tops e RPGs de mesa.
Mas ai, depois de um tempinho na seca… você vê uns anúncios de um jogo cyberpunk chamado ”System Shock” e… inspirado na série Ultima?! E você pensa: CARAMBA, ULTIMA É PERFEITO PARA OS FÃS DE D&D! SERÁ QUE VAI FAZER JUS AOS DE CYBERPUNK?
Ai é nessas horas que você caí na real: ele era único, e já lançava no meio de uma indústria que cobiçava a sua existência há anos! System Shock tem tamanha responsabilidade pela familiarização do cyberpunk aos vídeo-games quanto Blade Runner 2019 tem para os cinemas. Funcionários da CD Projekt Red estudaram firmemente a obra original para desenvolver conceitos e atmosferas para o infame Cyberpunk 2077.
Pera, o que é um immersive sim mesmo?
Para aqueles não familiarizados com o termo ”immersive sim”, eu irei explicar: consiste em um gênero de jogos, que traduzindo, significa ”Simulador Imersivo”. Basicamente, é um gênero onde enfatiza e eleva conceitos de game design, para simular bem uma realidade palpável em um vídeo-game.
Immersive sims geralmente são jogos extremamente complexos, com diversas mecânicas e conceitos aplicados em sua gameplay. Geralmente, immersive sims são relacionados a dois elogios frequentes: extremamente criativos e atmosféricos.
Fazer um immersive sim é um desafio ENORME, e isso explica o motivo de vermos tão poucos serem lançados hoje em dia. Se não fosse por empresas como a Arkane Studios, estaríamos amaldiçoados a não jogar mais títulos desse gênero, já que eles *geralmente* possuem a má fama de venderem muito mal.
Por isso, não é incomum de encontrar diversos jogadores apaixonados pelo gênero, e principalmente, escutar deles que ”X” immersive sim, é um dos melhores jogos que já jogou (tenho isso com Bioshock). São jogos extremamente memoráveis, que possuem legiões de fãs em todo lugar.
Mas o que ele faz de bom?
Imagina o seguinte: você acordou no meio de uma estação espacial. Tu não sabe seu nome, muito menos entende onde está e o porquê de estar lá. Tudo que você tem a sua frente é um corredor colorido, mas morto. Corpos de tripulantes são vistos em todo lugar na nave e criaturas humanoides bizarras estão tentando arrancar o teu couro. E tudo que lhe guia… é uma voz.
Uma estranha, porém familiar, voz robótica te guia nesses corredores hostis, te indicando e sugerindo abordagens para talvez sobreviver. Em determinada situação, você se vê com uma arma totalmente emperrada e com a possibilidade de EXPLODIR na sua mão… para isso, talvez seja sábio criar uma distração em algum corredor, para que você possa fugir das criaturas lobotomizadas. Ta sacando o que eu to querendo dizer?
Tudo isso era possível em um jogo de 1994! System Shock é um REI do game design. Oferecendo variadas formas de resolver os problemas propostos, o título acaba por se distanciar de conceitos scriptados e lineares, portanto, fornecendo uma liberdade muito gostosa de experimentar. Desafiando a lógica do jogador e estimulando a criatividade do mesmo para o avanço, System Shock não tem medo de inovar ao incorporar estereótipos da época no processo de storytelling.
De uma atmosfera recheada com sons que transmitem um tom de ”insegurança”, para sequências de tiroteio tático em corredores desolados, tudo acaba sendo familiar. Mesmo que certas mecânicas não tenham envelhecido bem, tais como o comportamento da câmera, o título de 1994 ainda possui amplas qualidades. O remaster da Nightdive Studios (a mesma responsável pelo remake) corrige alguns desses problemas, preservando a estética e design original.
Mas a parte mais legal é essa
Um aspecto que sempre teceu elogios para a série, foi a forma como sua narrativa e escrita fora inovador para a época. O design e writing de System Shock rodou em volta de solucionar um simples problema: como se afastar de storytellings massivos e chatos, que preenchiam as aventuras do seu precursor Ultima?
A solução seria simples e elegante: System Shock usaria de storytelling visual e ”diários de áudio”, para desenrolar sua trama. Lembra da voz robótica que te auxilia no começo do jogo? Suas colocações eram extremamente ambíguas, forçando o jogador a interpretar sequências de voz com o cenário e, especialmente, com suas ações.
Com ajuda da magnífica trilha sonora de Tim Rises, System Shock criava uma atmosfera única, elevando as inspirações cyberpunks a outro patamar, e executando com maestria o propósito original do projeto: uma simulação imersiva.
E tem mais!
Impossível de não ler isso e pensar ”caramba Otávio, se o jogo é tão importante e impressionante assim, cadê um novo?”. E é pra isso que existe a Nightdive Studios e a OtherSite Entertainment!
Há mais ou menos dois anos, obtivemos a revelação de que a sequência de System Shock 2 está em desenvolvimento pela mão de vários developers originais! Infelizmente, sobre esse caso não tenho muitas notícias… fica para a próxima.
Mas para aqueles que não estão familiarizados, a NightDive é um estúdio indie, liderado por antigas mentes da indústria, que se dedica em função de reviver e remasterizar clássicos esquecidos no tempo. Graças a ela podemos rejogar games como Turok, Sin: Gold, Forsaken e SYSTEM SHOCK.
O remake que em breve sairá para PC, nas plataformas da Epic Games, Steam e GOG, será o primeiro grande projeto do estúdio, e tem tudo para arrasar e conquistar novos entusiastas para o gênero immersive sim. A demo, que se encontra na página da Steam, já nos dá um prévia de como será reviver os eventos do clássico.
O remake de System Shock está para sair nesse próximo mês de Agosto, e tem tudo para ser um fortíssimo concorrente de diversas premiações. Rezamos para que as maestrias em remasterizações tenham ajudado a NightDive a reviver esse nostálgico game. Com sorte, reviveremos todas os pontos fortes apontados nesse texto em um nível de qualidade modernizado e repaginado!