Por que você DEVE jogar Way of the Samurai 3?
Essa série de textos já está um pouco antiga, e conforme o desenrolar dela até o presente, acredito que meus leitores já estão acostumados a verem recomendações diferenciadas e estranhas por minha parte. Honestamente, Way of the Samurai 3 continua nessa mesma vertente, um jogo estranho, extremamente experimental em certas partes, mas que no final, me conquistou profundamente por conta de sua identidade marcante e única.
A melhor forma que eu posso ”resumir” a experiência deste título, seria traçando um paralelo de ”e se Samurai Champloo fosse um game?”. A franquia Way of the Samurai segue mais ou menos essa vertente, abraça as doideiras de temáticas e humor oriental, e enfia isso no meio de dramas muito bem escritos que circulam as temáticas dos thrillers de samurais antigos, dignos de se comparar as obras de Akira Kurosawa.
Mais interessante do que o assunto em questão, é se pudermos separar um tempinho para observamos a fundo o estúdio que produz os títulos da série, e muitos outros que são extremamente interessantes e diferentes dentro do mercado de games, que no caso, seria a ACQUIRE Corp.
Uma história longa, e um currículo tão longo quanto
Quando eu paro para falar sobre e elogiar a ACQUIRE, as pessoas raramente reconhecem pelo nome em sí. Mas quando eu paro pra falar sobre dois títulos que ela trabalhou anteriormente, todos ficam surpresos e falam ”ahhhh, esses caras”. Os jogos que me refiro são os títulos inicias da franquia Tenchu, e o maravilhoso Octopath Traveler que está mais ”fresco” na memória dos consumidores atuais.
A história da ACQUIRE começa a 25 anos atrás, no PlayStation 1. Desenvolvendo o incrível Tenchu: Stealth Assassins que adquiriu um status gigantesco de vendas no console, e permitiu que o estúdio desenvolvesse uma franquia a partir disso. Anos depois, Tenchu 2 viria para encerrar com chave de ouro a presença do estúdio no seu console ”natal”, e então a empresa começaria a escrever sua história no console do futuro.
Já no início dos anos 2000, os desenvolvedores acabariam por lançar o primeiro título, da então nova franquia ambiciosa, Way of the Samurai. Um ”simulador” do dia a dia de um samurai criado pelo jogador, que viveria através do processo de modernização do xogunato japonês. Em outras palavras, o processo de morte dessa cultura antiga dos samurais dentro do Japão antigo.
Como antes dito, o jogo era muito mas muito ambicioso para um título de PS2, não apenas tinha um mundo aberto, mas também possuía um ciclo de dia e noite, e abraçava um plot rico em detalhes, possibilitando até mesmo escolhas de rotas alternativas para o jogador, onde que, a depender da presença e escolhas do jogador em certo horário e dia , durante uma jogatina, o mundo poderia mudar drasticamente, culminando em vários finais diferentes.
Cuidadosamente esculpido e polido através do tempo
O jogo que venho recomendar hoje, só irá ver a luz do dia em 2008. Mas até lá, a ACQUIRE publicaria ainda outro Way of the Samurai, e mais alguns outros títulos experimentais no PS2, como o extremamente divertido (e raríssimo de se encontrar) Samurai Western.
Se você olhar atentamente ao currículo da ACQUIRE, você notará que ela está sempre experimentando com algo novo, ao mesmo tempo que publica/desenvolve uma sequência de alguma de suas franquias. Eu diria que isso gera certos defeitos e qualidades em seu game design num geral, visto que, boa parte dos jogos da ACQUIRE são muito bons em criar atmosfera e story-telling aos jogadores, ao mesmo tempo que continua tendo aquele gostinho de ”vídeo-game” bem secretamente curado em sua centralidade. Porém, todos os jogos antigos da ACQUIRE possuem aquele… ”janky”, fortemente presente em jogos japoneses low-budget (baixo orçamento).
De certa forma, eu encaro isso como uma qualidade da empresa e de seus jogos, pois é um fator de identidade que seus jogos possuem até hoje (sim, até Octopath Traveler tem isso). Desde um sistema de combate meio (ou extremamente) desfuncional, diálogos de qualidade questionável e, óbvio, sistemas e mecânicas que estão presentes, mas que nem sempre funcionam como deveriam (e essa é a melhor parte).
Então, durante esse tempinho entre Tenchu 1 e Way of the Samurai 3, a ACQUIRE aprendeu muito em diversos fatores e departamentos de game design. E quando chegamos nesse título de 2008, confesso que o jogador acaba por experimentar um título que abraça todos os altos que a empresa tem a oferecer, sendo uma experiência extremamente marcante para todos que jogaram na época, ou que tentam jogar hoje em dia.
Agora nós falamos sobre Way of the Samurai 3, né?
Sim! Finalmente chegou a hora que eu falo sobre o jogo, demorou, mas cá estamos. Eu falo isso em quase todo texto, mas meu deus, eu tenho um carinho enorme por esse jogo. Minha primeira experiência com Way of the Samurai 3, vem lá de 2012 com o meu antigo Xbox 360.
Lançado originalmente para ambos os consoles HDs da época (PS3 e 360), o título fora recebido com reviews bem amargas ou medianas. Em grande parte pela imprensa ”profissional”, que reconhecia as intenções da obra, mas julgava-a como ”amadora” ou, em alguns casos, extremamente ”mal feita”.
Em contrapartida, a comunidade que a empresa criou sua história em volta, recebeu o jogo com bastante entusiasmo e emoção. Boa parte da maioria dos consumidores dos jogos da ACQUIRE, são japoneses, e isso explica o porquê de muitos de seus jogos serem exclusivos daquela região, alguns nunca nem foram lançados para o Ocidente.
Porém, mesmo com essa recepção amarga na imprensa ocidental, o jogo vendeu bem o suficiente para receber uma versão nova nos anos seguintes, com uma expansão de conteúdo, fornecendo novos finais, mecânicas e redesigns de gameplay, entretanto… ela é exclusiva do Japão. Portanto, a minha experiência com Way of the Samurai 3 é apenas com a sua versão base e não a ”definitiva” que está longe do nosso alcance, no momento (mais sobre isso daqui a pouco).
Muita vida e identidade em algo ”datado”
Olha, já tenho que te dizer uma coisa, se você é um entusiasta de gráficos em vídeo-games, acredito que você vai se decepcionar com Way of the Samurai, e provavelmente todo e qualquer outro jogo da ACQUIRE. Esse nunca foi o forte dos caras, e acho que vai continuar assim por um bom tempo.
No meu texto sobre Risen (da uma olhadinha lá depois), eu comento que nem sempre você precisa de tecnologia e gráficos de ultima geração, para fazer uma experiência envolvente e imersiva. Acredito que WOTS3 é um grande exemplo disso, pois não apenas somos colocados num mundo vivo e repleto de interatividade, como também esse mundo funciona e vive com ou sem a participação definitiva do jogador.
Sim, existem eventos que possuem/devem ter a presença do jogador para desenrolar, mas a partir de certos ”dias” dentro do jogo, alguns eventos acontecerão com ou sem a sua interferência, culminando em opções e finais alternativos.
Way of the Samurai é uma franquia que incentiva o jogador a rejogar e rejogar, e tentar experimentações diferentes com suas mecânicas e mundo, a fim de tirar proveito dessas opções e caminhos alternativos. Então, caso você não esteja conseguindo o que quer de fato nessa jogatina, existe sempre um botão para você literalmente recomeçar a campanha, sem mais ou outra, é só apertar e você recomeça o jogo, carregando os upgrades e itens da última jogatina.
O ”janky”
Olha, Way of the Samurai 3 não tem o mesmo finess mecânico de um Devil May Cry ou Ghost of Tsushima. Nem mesmo tem um sistema profundo de combate, com combos ou finalizações diferentes ou coisa do tipo. Tu tem uma espada, tu tem um estilo diferente para cada tipo de espada, logo, você acaba por ter um arsenal diferente de golpes, que estão presos nesses ”estilos” diferentes de espada.
Além disso, você tem uma barra de ”postura”, popularizada recentemente com Sekiro, essa barrinha de postura já existia lá atrás, desde o primórdios dos jogos da ACQUIRE. Num geral, o combate consiste em você sentar a porrada em alguém, até ele cair e morrer. Nada muito sinistramente profundo, mas funciona.
O combate até mesmo tem seus altos em boss fights contra os personagens principais da trama, culminando em alguns duelos tensos que, provavelmente, vão estourar as veias da testa de vocês, no momento que vocês perceberem que a sua espada tem durabilidade, e ela quebrou no meio dessa boss fight crucial (é, o jogo tem isso também). Mas, honestamente, o jogo tem muita experimentação por parte do combate, você provavelmente vai encontrar um estilo que te agrada, e permanecer com ele em todas as jogatinas. Só não esquece de dar upgrade na durabilidade da espada, pelo amor de Deus.
A história é muito boa! (sério)
Olha, se você jogar 20-30 minutos do jogo, você provavelmente vai achar que não é pra levar ele a sério, principalmente o plot. E eu não te culpo, sabe? O jogo ta cheio de coisa goofy e cheesy, então as vezes é difícil de levar a sério.
E provavelmente, os primeiros finais que você for pegar serão um lixo (falo por experiência própria), porque você definitivamente não vai entender todas as mecânicas e sistemas logo de cara. O jogo tem uma pequena falha nesse departamento, porque ele não explica tão bem o caminho ou o que o jogador tem que fazer de fato. Ele dá tanta liberdade, mas não explica os limites ou formas de usá-la ao seu favor.
Sendo assim, é bom dizer que as rotas e storylines de Way of the Samurai 3, são muito interessantes e bem escritas, por incrível que pareça! Você tem desde um drama envolvendo linhagens de clãs extintas, como também a ascensão de um grupo rebelde que luta contra a soberania do xogum da região, ou talvez, você pode tentar traçar e colher as evidências sobre uma conspiração de um viajante do tempo. O jogo tem mais de 20 finais (sério), bixo, então vai ter bastante coisa para vocês jogarem.
Ok amigo, como que eu jogo essa fita?
Bem, de certa forma você tem três (ou quatro) opções. A primeira delas, e a mais recomendável, seria comprando o jogo na Steam, onde está na sua versão mais acessível e modificável, tendo até mesmo uma fanbase dedicada que faz modificações e patches para que o jogo funcione em hardwares atuais. A outra opção seria jogando no Xbox, pois o mesmo é um título retrocompatível. A terceira, e não muito funcional e disponível para nós brasileiros, seria jogando-o através do sistema de assinatura PS Now nos consoles de PS4 ou PS5.
E a quarta opção, válida também mas nem tanto, seria emulando-o através dos emuladores de PS3 ou 360, mas no fim ao caso, por que você faria isso sendo que o game já está na Steam, né?
Alguns parágrafos atrás, eu disse algo sobre não termos acesso a versão definitiva do jogo no momento, e o motivo de eu ter mencionado isso, é que recentemente a ACQUIRE começou a re-disponibilizar títulos antigos nos consoles e computadores atuais, alguns pela primeira vez no ocidente. Um deles é o querido ”KamiWaza: Way of the Thief”, lançado originalmente no PS2, que é basicamente um simulador de ladrão durante o período do xogunato japonês.
Então, de certa forma eu imploro para que vocês, meus lindos leitores, experimentem os jogos da ACQUIRE! Pois, de alguma forma, teremos a possibilidade de ver mais de suas esquisitices sendo relançadas pra cá nos nossos mercados. Ainda sonho, todos os dias, com um relançamento/remaster do Samurai Western… quem sabe algum dia, né?