Crítica | 007 – Sem Tempo para Morrer
James Bond finalmente retorna no mais novo filme 007 – Sem Tempo para Morrer (2021), seis anos após o lançamento de 007 – Contra Spectre (2015). O filme estreou no dia 30 de setembro nos cinemas, após ser adiado por conta da pandemia. Dirigido por Cary Joji Fukunaga (True Detective), o título traz James Bond interpretado por Daniel Craig após uma saga de 4 filmes, ou seja, amadurecido e ao mesmo tempo vulnerável diante dos acontecimentos que seguem os eventos do episódio anterior da franquia. Sendo assim, o laço que une os filmes da franquia 007 em Sem Tempo para Morrer não é a fórmula clássica que se repete, mas sim o próprio desenvolvimento dos personagens ao longo dos filmes anteriores, o que acarreta em uma nova missão para James em tom de conclusão.
A história do filme gira em torno do aposentado James Bond, separado da Dra. Madeleine (Léa Seydoux), depois de suspeitar que ela o teria traído ao entregar a sua localização. Após um retiro na Jamaica, o agente secreto se vê obrigado a voltar ao mundo da espionagem para ajudar o agente da CIA Felix Leiter, devido a uma nova tecnologia de nanorrobôs, uma espécie de vírus letal utilizado para matar pessoas específicas – tipo a foxdie em Metal Gear Solid. É curioso como a franquia Metal Gear Solid sempre se inspirou em 007, e agora parece que o filme se inspira de volta no jogo de Hideo Kojima, pois carrega muitas semelhanças com suas histórias. No entanto, tudo indica que é uma mera coincidência temática. Nesse contexto, James Bond se vê preso em uma missão que envolve seu passado, o passado de Madeleine, sua renúncia ao posto de 007, além de questões pessoais referentes ao seu desenvolvimento durante a franquia.
Um 007 em clima soturno e conclusivo
Como dito antes, esse 007 não está preso à conhecida fórmula da franquia, e isso traz um frescor, pois o filme se desenvolve de forma mais furtiva e ao mesmo tempo aprofundada psicologicamente. O próprio estado psicológico de James Bond é levado ao extremo, mas não da forma usual dos outros filmes, como quando ele é capturado ou torturado. E os diálogos enigmáticos dos vilões – tanto o inimigo do filme anterior quanto do filme atual – levam James à dúvida imensurável, e não às soluções certeiras do agente secreto, capaz de contornar qualquer situação. É justamente essa incapacidade do agente, essa vulnerabilidade, que vai traçando o caminho para o desfecho, ainda que ele se mostre tão eficiente como sempre.
“We used to be able to get into a room with the enemy. And now, they’re just floating in the ether.”
Apesar do tom sombrio – até mesmo em alguns cenários –, a primeira parte do filme traz aquela ação já conhecida e nos mostra personagens promissores como Paloma (Ana de Armas) e Nomi (Lashana Lynch), que ofuscam o brilho de James e estrelam cenas que nos fazem querer mais. Em seguida, o filme nos prende em momentos sufocantes de tensão, que não são apenas tiroteios ou perseguições de carros, mas sim uma combinação de um James Bond fragilizado com uma atmosfera que é criada através das situações de perigo. Parece que a partir deste ponto, os demais personagens surgem como suporte fundamental, num rumo que aos poucos vai selando esta fase da história do 007.
Justamente neste clima penumbroso experimentado, pode-se observar a combinação do visual mais soturno com a trilha de Hans Zimmer – parecido com o que Villeneuve faz em Duna (2021) –, utilizada para potencializar uma tensão sombria, se misturando estrategicamente num silêncio muito bem aproveitado, não tão presente nos filmes anteriores. Em seus 163 minutos de duração, vamos aos poucos sendo engolidos por essa neblina de anseios que embaraça a cabeça de James, que se desenrola em localidades como a Itália, Jamaica, Escócia e Noruega. Inclusive, em certa parte que se passa na ilha de Kalsoy, localizada entre a Escócia e a Islândia, é impossível não lembrar de Death Stranding (2019), ao ver Léa Seydoux atuando nessa região montanhosa que inspirou a paisagem do jogo.
No geral, apesar de 007 – Sem Tempo para Morrer (2021) ser uma trama pessoal e decisiva para James Bond, o longa consegue distribuir momentos para a maioria dos personagens. O trabalho culmina em um conjunto onde novas faces são introduzidas, ao mesmo tempo em que figuras recorrentes têm seu espaço, desde o responsável pelas engenhocas do serviço de inteligência britânico Q (Ben Whishaw), com seu característico humor discreto, até Madeleine (Léa Seydoux), que fez sua primeira aparição em 007 – Contra Spectre (2015) e agora se mostra envolvida até a raiz no conflito que James Bond tenta resolver. E claro, não dá para deixar de falar no vilão Safin (Rami Malek), calculista e também um reflexo antitético de Bond, se mostrando um profundo e bom adversário ao “alugar um triplex” na cabeça do agente.
007 – Sem Tempo para Morrer (2021) se mostra um ótimo filme, equiparando-se aos igualmente excelentes 007 – Cassino Royale (2006) e 007 – Operação Skyfall (2012). No entanto, de forma substancialmente diferente, arrisca-se em um rumo fora da fórmula, adentrando as questões internas do agente Bond, ao mesmo tempo que finaliza com um desfecho impactante, acarretando inúmeras especulações em relação à franquia. A trama consegue aproveitar bem os eventos ocorridos em 007 – Contra Spectre (2015), que foi um filme morno, e ao dar seguimento, chega ao ápice dos filmes dessa safra. É um título muito específico da franquia, mas que já se tornou fundamental e conclusivo para tudo o que foi construído no 007 de Daniel Craig