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Análise | Gotham Knights até tem boas ideias, mas peca na execução

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Análise | Gotham Knights até tem boas ideias, mas peca na execução

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É impossível avaliar um game de super-heróis sem citar a trilogia Batman Arkham da Rocksteady. O estúdio britânico basicamente ditou regras de como os games do gênero seriam feitos a partir de então, sendo o combate em terceira pessoa o grande pilar desses jogos, além das engenhosas mecânicas de stealth que é possível encontrar até mesmo em Marvel’s Spider-Man (2018), título da concorrente. Portanto, por mais que a desenvolvedora Warner Bros Montréal tenha deixado claro que Gotham Knights não tenha nenhuma conexão com os três títulos do cavaleiro das trevas, o DNA desses jogos está todo aqui, ainda que falte a mesma profundidade que se encontra neles.

Em mais de 30h que passei com Gotham Knights, fica exatamente a impressão que o jogo da Warner Bros estava o tempo todo nas sombras da série Arkham. Por mais que eu tenha colocado em mente para evitar quaisquer comparações entre os jogos, vi que seria uma tarefa um tanto quanto complicada, porque para esta análise, o jogo do cavaleiro das trevas precisará ser citado, pois afinal, ele é o pilar deste gênero. Mas isso não quer dizer que Gotham Knights não tenha espaço para brilhar, porque há sim boas ideias presentes no jogo da Batfamília e que, apesar dos vários deslizes, consegue trazer alguns momentos interessantes.

O Batman morreu. E agora?

Fique calmo! Isso não é um spoiler de Gotham Knights. Inclusive, a morte do morcegão ocorre logo nos dez primeiros minutos de cutscene e serve como a principal premissa da narrativa do jogo. Agora, quem assume o dever de proteger Gotham é a Batfamília, composta por Asa Noturna (Dick Grayson), Batgirl (Barbara Gordon), Capuz Vermelho (Jason Todd) e Robin (Tim Drake). 

Após a morte de Batman pelas mãos de Ra’s al Ghul (que também acabou batendo as botas no processo), o quarteto de vigilantes sai em busca de respostas na tentativa de solucionar o mistério por trás da morte de Bruce Wayne, mas o que acabam encontrando os levam a investigar uma antiga lenda de Gotham City, a existência da Corte das Corujas.

A Corte das Corujas há um tempo vinha sendo especulada como um dos próximos vilões a aparecer em um jogo do cavaleiro das trevas, sendo muito requisitada até pelos próprios fãs de HQs e/ou jogos (eu me incluo nessa), e a existência da organização em Gotham Knights dá aquele sopro de ar fresco depois de passarmos vários jogos do Batman na presença de figuras já repetidas como o Coringa e o Espantalho. Até mesmo a ausência do Homem Morcego nessa história já é uma mudança muito bem-vinda, já que o quarteto da Batfamília traz personagens muito interessantes e que dessa vez tem sua oportunidade para brilhar, algo que não era possível na série Arkham devido a natureza de seus papéis mais secundários nas tramas.

Porém o brilho da premissa fica somente na premissa, já que Gotham Knights traz uma narrativa bem estilo sessão da tarde, e com uma abordagem muito mais light em comparação à série Arkham, que sempre preferiu adotar um tom bem mais sério em suas campanhas. Não que isso seja um ponto negativo, mas o grande problema aqui é que a escolha da mudança de tom provavelmente afetou na previsibilidade da história e, principalmente, na falta de profundidade na caracterização da Corte das Corujas pois, infelizmente, a organização secreta possui pouco tempo para mostrar de fato toda sua influência e medo que causa sobre Gotham. Um banho de água fria para nós que esperamos tanto tempo por sua aparição nos jogos do Homem Morcego.

Mas enquanto Gotham Knights falha em trazer uma boa caracterização de seus vilões principais em uma narrativa bem previsível e sem muitos momentos memoráveis, a Batfamília felizmente não cai na mesma armadilha. Um dos meus maiores medos com o game era justamente que essa falta de tempo também afetasse minha afinidade com o núcleo dos heróis, mas a WB Montréal acertou em cheio na caracterização dos nossos protagonistas ao mostrar seus lados mais humanos enquanto não estão salvando Gotham.

É no campanário – uma espécie de lobby que acessamos antes de sairmos para patrulhar a cidade – que a maioria das interações entre a Batfamília ocorrem, e cada um dos personagens jogáveis possui uma linha de sidequests mostrando como eles estão lidando com o luto da morte de seu mentor, além de outros problemas mais internos. São séries de cutscenes bem legais e interessantes que trazem o tempero que faltou na campanha principal, e mostra como o estúdio tinha todo o potencial para desenvolver uma história mais engajante caso tivesse um pouco mais de tempo nas mãos.

Patrulhando as noites de Gotham

Após planejar seus próximos passos no campanário e escolher com qual dos quatro vigilantes queremos jogar, passamos a ter acesso ao mapa de Gotham por completo e é aqui que as comparações com Arkham Knight vão se tornando cada vez mais frequentes e inevitáveis porque, sim, o mapa de Gotham Knights é de fato uma versão bem inferior ao do jogo do cavaleiro das trevas, mas não pelos motivos que você tá pensando.

Gotham Knights deixa claro em seu início que a morte do Batman trouxe o caos novamente a Gotham, com bandidos e gangues amedrontando pessoas e ocupando vários dos locais da cidade, mas na prática, não é bem isso o que ocorre. O mapa é extremamente vazio, tanto na questão de atividades quanto na densidade de NPCs. Se em Arkham Knight o jogo fazia questão de mostrar uma atmosfera completamente caótica e dominada por bandidos, com dezenas de crimes ocorrendo ao mesmo tempo, passando assim uma sensação mais crível de perigo, Gotham da WB Montréal parece ser extremamente desconexo da narrativa principal, mais parecendo uma cidade comum do que a representação que já estamos acostumados a ver em diferentes mídias sobre o Homem Morcego.

Cidadãos passeiam tranquilamente perto de um crime em andamento e as gangues em nenhum momento parecem ter o suposto controle que deveriam ter sobre a cidade. Sem contar que, não há diversidade nas atividades de patrulha, sendo a grande maioria delas apenas impedir crimes comuns, além dos já conhecidos coletáveis. Essa desconexão entre o mapa e a história do jogo e a falta de atividades mais engajantes e que de fato acompanham o andar da narrativa são os maiores problemas aqui, e não a ausência de efeitos visuais como vimos em várias fotos comparando os mapas de ambos os jogos.

Além disso, a mobilidade pelo mapa do jogo não é uma das mais prazerosas. Se em Arkham City e Knight nós podíamos nos movimentar por Gotham com o ótimo sistema de voo do Batman, Gotham Knights faz com o que o jogador dependa muito mais da Batmoto, já que a habilidade de planar sob os ares está atrelada a completar uma das sidequests do jogo, os testes de Grau de Cavaleiro. O jogador precisa completar esses testes com cada um dos quatro heróis para poder desbloquear a habilidade de se movimentar pelos céus e, ainda assim, não é tão satisfatório como nos jogos Arkham, já que os movimentos são bastante limitados e não geram impulso necessário para que os personagens mantenham-se planando por muito tempo. No fim, é melhor ir de moto.

Felizmente encontros repetitivos com as gangues e máfias de Gotham não são apenas as únicas atividades que você irá encontrar quando você quiser dar uma pausinha na sua investigação pela Corte das Corujas, já que três vilões icônicos dão as caras em Gotham Knights e trazem substories que, apesar de relativamente curtas, são bem divertidas de se acompanhar.

Arlequina, Sr. Frio e o Cara-de-Barro protagonizam suas próprias linhas de missões, independente da campanha original, e ainda trazem desafios muito bem-vindos para a falta de variedade que encontramos nas atividades secundárias restantes do jogo. Inclusive, suas respectivas batalhas foram uma grande surpresa na minha jogatina, não só por cumprirem seu papel em entreter e trazer um bom desafio, como também mostrou que a equipe da WB Montréal tem bastante talento no quesito boss fights. Claro, sempre falta um pouco de polimento aqui e ali, principalmente no quesito do combate, que é um dos tópicos que iremos falar justamente agora.

Combate e o bendito sistema de RPG

Arkham Asylum, o primeiro jogo da trilogia do morcegão, agraciou o mundo em 2009 com um dos combates mais divertidos e responsivos do gênero ação em terceira pessoa, e foi aprimorando sua própria fórmula com o passar dos anos ao mesmo tempo que influenciava outras desenvolvedoras que passaram a desenvolver jogos do mesmo gênero. O que quero dizer aqui é que a equipe da Warner Bros Montréal basicamente tinha a faca e o queijo na mão para seguir o mesmo caminho que seus antecessores, mas que por algum motivo, abriu mão da fórmula pronta e inseriu mudanças um tanto quanto questionáveis e problemáticas.

Primeiramente, o combate foi extremamente simplificado graças a quase inexistência de combos e limitando movimentos especiais a uma nova mecânica chamada Habilidades de Impulso. Todos os ataques comuns sempre irão se limitar a apertar quadrado ou X para atacar ou carregar um ataque mais forte, desviar no círculo ou B e lançar projéteis no triângulo e Y, nunca dando espaço para experimentações ou apresentando novas maneiras do jogador de derrotar certos inimigos.

Já as Habilidades de Impulso entram no lugar da já conhecida árvore de habilidades e oferece uma gama limitada de novos ataques, e que só podem ser desbloqueadas se o jogador se comprometer a resolver desafios propostos pelo jogo. Assim que desbloqueadas, é preciso causar dano nos inimigos para encher a barra de impulso presente no lado inferior direito do HUD dando assim a possibilidade de usar esses novos ataques.

Toda essa limitação no combate torna o que deveria ser a parte mais prazerosa do jogo em um loop de ação bem repetitivo, chegando até mesmo a afetar a abordagem stealth que o jogo possui, e que muito raramente irá explorar o potencial de ambos os estilos de forma competente. Toda a complexidade e refinamento que a série Arkham adquiriu durante os anos deram espaço para um sistema extremamente simples e sem profundidade, o que me faz questionar a motivação dos diretores em seguir com essa abordagem, e não com uma que serviu até mesmo de exemplo para o jogo do amigão da vizinhança.

Nem mesmo a ideia proposta de trazer uma gameplay diferente ao jogar com um dos quatro membros da Batfamília traz de fato uma mudança significativa. Cada herói possui “atributos” exclusivos que não se encontram em outros personagens, como no caso da Batgirl, que por exemplo, possui habilidades de hackear câmeras, enquanto o Capuz Vermelho é mais focado em combate corpo-a-corpo e por isso (supostamente) possui uma força muito maior que a de seus companheiros.

O meu resultado ao jogar com os quatro personagens e alternando-os de uma missão para outra acabou sendo uma experiência bastante similar entre o elenco de mascarados. O grupo de vigilantes mais parecem uma cópia de si mesmos, apenas mudando as animações de suas acrobacias e poses de luta, e em nenhum momento senti que a especialidade do Robin em stealth tenha me favorecido mais ao mesmo tempo que eu adotava o mesmo estilo de jogo com o Capuz Vermelho, ou que a habilidade de hackear câmeras da Batgirl tenha feito falta nas minhas jogatinas com o Asa Noturna. O que acontece aqui é que, como dito acima, a abordagem do combate e stealth são tão superficiais que fica difícil o jogo me oferecer momentos específicos onde as habilidades de cada herói possam se sobressair. No final, eu escolhia jogar com os personagem com que eu tinha mais afinidade, e não baseado em suas especializações.

O fator RPG é outro ponto que também parece mais placebo que de fato um diferencial na gameplay. Da mesma maneira que ocorre em God of War (2018), por exemplo, os números dos atributos de suas armas e armaduras não parecem fazer nenhuma diferença, mas o que vai importar de fato aqui, é o nível delas.

Isso se tornou perceptível para mim quando, durante minha gameplay com o Robin, equipei o personagem com armadura e arma abaixo do nível atual que ele se encontrava, mas que possuía atributos maiores que a dos outros heróis que estavam com um set de nível correspondente. O resultado foi danos e defesa aquém do esperado para equipamentos com atributos tão altos, e foi justo quando troquei seu set para um de nível 27 (que era o nível atual que o meu Robin se encontrava), que enfrentei os mesmos vilões novamente e não encontrei a mesma dificuldade que estava enfrentando com o set anterior.

Meu caso prova como Gotham Knights possui um sistema de RPG que mais serve para iludir o jogador com números inflados mas que não afetam diretamente o sistema de danos e absorção. Um sistema que, inclusive, parece se alastrar cada vez mais dentro da indústria AAA ocidental. O título acaba obrigando indiretamente o grinding e a realização das repetitivas missões de patrulha para que o jogador consiga desbloquear armaduras e armas novas correspondente ao nível do seu personagem. Portanto, prepare-se para passar umas boas horas subindo de nível para acessar até mesmo as missões de campanha, porque no fim das contas, são os níveis que contam.

Uma chance desperdiçada

Uma nota bem pessoal: apesar dos poréns, eu gostei de passar meu tempo com Gotham Knights. Sim, é bem esquisito escrever isso depois de citar vários problemas que o jogo possui, mas não posso negar que a representação da Batfamília, suas histórias e o conteúdo secundário dos vilões de Gotham me entreteram o suficiente para suportar um mapa pouco inspirado e o combate superficial do título. Está longe de uma bomba, mas também não posso negar que ele deixa escapar várias das chances de ter sido um jogo tão bom quanto os da série Arkham.

Seus maiores problemas denunciam uma falta de polimento e maior tempo de desenvolvimento, e espero que na próxima oportunidade, a Warner Bros Montréal tenha a oportunidade de mostrar o talento escondido que existe naquele estúdio, pois Gotham Knights até chega a mostrar um vislumbre disso, mas que se apaga rapidamente quando lembramos de seus deslizes.

Gotham Knights para PlayStation 5 foi gentilmente cedido pela Warner Bros. Games para a realização desta análise.

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