Em todo o gênero de comédia, são poucos os clichês mais maçantes que a parte em que o filme, numa obrigação de seguir formulas de narrativa comercial, se esvazia de qualquer ritmo cômico que vêm ganhando para dar espaço à tradicional transição de segundo ato, onde o protagonista se encontra no seu ponto mais baixo e tem de se reerguer. Saem as piadas, entra o protocolo, e você é obrigado a passar 15-20 minutos com o filme querendo te convencer que é um drama com consequências até o Leandro Hassum achar uma solução ao dilema e o filme poder voltar a ser o que o público pagou pra assistir.
Uma equipe criativa conhecida por fazer comédia de formato curto tentar se aventurar no longa é outra coisa que deixa com o pé atrás. Nem todo mundo é Monty Python, e é comum que esses projetos perderem a essência no novo formato ou denunciarem a limitação dos criadores. melhorar essa última fras
O Filme do Bruno Aleixo foi vítima desse último caso. A primeira tentativa de adaptar a franquia portuguesa acabou sendo menos um filme e mais várias esquetes alongadas, amarradas tematicamente por uma premissa de reunião dos personagens propondo ideias para um filme. Engraçado, sim, mas não é uma transição lá muito interessante para a mídia do cinema.
Então é uma grata surpresa que O Natal do Bruno Aleixo tenha conseguido superar todas esses obstáculos e se mostrar um ótimo filme de Natal, com momentos cômicos e dramáticos, sem comprometer a identidade dos personagens já bem definidos. E com premissa básica, em que Bruno Aleixo sofre um acidente que o deixa em coma, os criadores João Moreira e Pedro Santo usam como pontapé inicial para uma história introspectiva sobre o personagem central.
O filme se dá em dois momentos: No presente, em que os vários amigos do personagem tentam reanimar o amigo, e nisso vemos como cada um lida com a ausência dele. Antes definidos pelas suas interações com Bruno, agora o Dr. Ribeiro, Busto, Homem do Bussaco e Renato Alexandre são explorados fora da personalidade geniosa do líder.
Mas a verdadeira carga dramática (Duas palavras que não se espera ouvir sobre Bruno Aleixo) está nos flashbacks. Em grande estilo A Felicidade Não se Compra, Cidadão Kane e Um Conto de Natal, o coma de Bruno Aleixo traz vislumbres inéditos da sua vida passada. Em vários flashbacks desde a sua infância no Brasil, passando pelo casamento conturbado e o encontro dos amigos atuais, vemos os natais que formaram o e̶w̶o̶k̶ cachorro rabugento de meia idade que conhecemos hoje. E pasmem, esses flashbacks são animados! Ou melhor dizendo, animados tradicionalmente em 2D. O primeiro filme já contava com extensas cenas em live-action (embora com celebridades dubladas pelo elenco de Bruno Aleixo) para quebrar a monotonia de .jpegs que só mexem lábio, aqui os personagens ganham muito mais expressividade tanto para a comédia quanto para o drama, explorando possibilidades narrativas até agora impossíveis para esses personagens.
É sempre arriscado mexer em fórmula que dá certo. O projeto multimídia do Bruno Aleixo vem se desenvolvendo a quase 15 anos, com um estilo bem definido e personagens consagrados. Quando se propõe um filme desse jeito, há sempre uma preocupação em fazer algo mais grandioso, mais um evento, mais filme, resultando numa perda de identidade. O Natal do Bruno Aleixo faz essa transição parecer fácil, habilidosamente intercalando personagens absurdos porém mundanos, palavrões censurados na legenda e humor sarcástico com cenas de frustração É uma obra que mantém a essência de um mundo estabelecido, nos leva a cantos inexplorados e expande nosso entendimento dele, e extrai tudo isso só com os mais batidos clichês de batidos de filme de Natal.
O charme peculiar do Bruno Aleixo brilha nesse conto de Natal, e vai fisgar fãs e novatos.