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Crítica | Another Round – uma tese sobre o álcool e a angústia

Another Round

Cinema

Crítica | Another Round – uma tese sobre o álcool e a angústia

Lançado em 2020, Another Round é o novo filme do diretor dinamarquês Thomas Vinterberg.

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Another Round (2020) é um filme do diretor dinamarquês Thomas Vinterberg, cineasta conhecido por ter dado início ao movimento Dogma 95 ao lado de Lars von Trier. Assim como em The Hunt (2012), o diretor traz Mads Mikkelsen como protagonista, ator presente no jogo Death Stranding (2019), vencedor do TGA 2019 na categoria de melhor atuação. Neste filme, o ator retorna ao ápice de seus papéis dramáticos, interpretando um professor de história chamado Martin. Sem confiança, entediado e desiludido com a vida, o protagonista mergulha de cabeça em uma tese sobre o álcool, baseada em ideias da filosofia e da psicologia, numa esperança de melhorar sua vida.

Mads Mikkelsen atua de forma impecável em Another Round.
Mads Mikkelsen atua de forma impecável em Another Round.

Another Round concilia diferentes elementos da cultura dinamarquesa

A premissa de Another Round é um experimento elaborado por quatro professores de ensino médio que decidem ingerir álcool em todas as situações do dia. A ideia é baseada na teoria fictícia de Finn Skårderud, um filósofo e psiquiatra norueguês, que afirma que o ser humano tem um déficit de 0,05% de álcool no corpo. Segundo essa teoria, quando preenchemos esse déficit, nos sentimos mais relaxados e melhores conosco.

O filme se concentra em analisar o uso do álcool, apresentando diversas perspectivas sobre o assunto e retratando o consumo da substância na Dinamarca, juntamente com uma visão cultural europeia das bebidas. Também oferece informações e curiosidades sobre drinks e figuras históricas que faziam uso da substância. No entanto, não o faz de forma maçante, como uma simples tese, mas sim como um filme divertido que retrata com fidelidade os momentos de prazer no consumo das bebidas.

“O que é juventude? Um sonho. O que é amor? O conteúdo de um sonho.” KIERKEGAARD, Søren

A atmosfera sombria presente no filme representa bem os altos e baixos do alcoolismo, mergulhando em questões existenciais e filosóficas sobre o álcool como um refúgio para a ansiedade. Nesse aspecto, o filme explora as ideias do filósofo dinamarquês Søren Kierkegaard, que eternizou seu trabalho sobre a angústia e o desespero, sendo influente no movimento existencialista da filosofia e na psicologia.

Na visão de Kierkegaard, a angústia surge quando estamos diante de uma decisão, trazendo a ambiguidade de nossos desejos em relação à nossa liberdade de escolha. Essa consciência da liberdade de escolha é aterrorizante e, na intimidade religiosa do filósofo, leva ao pecado. Com isso em mente, o filme retrata a vida de Martin em uma oscilação entre a angústia e o prazer da vida, fortemente relacionados ao uso de álcool.

Além da trama envolvente, Another Round traz uma trilha sonora excepcional e muito bem utilizada. Em suas faixas, há artistas clássicos como Tchaikovsky, mas também músicas pop modernas, como o tema do filme intitulado “What a Life”, de autoria do trio pop dinamarquês Scarlet Pleasure. Essas músicas preenchem os cenários frios da Dinamarca, mas também atingem o ápice da felicidade dos personagens, realçando o filme com uma aura positiva.

A impressão é de que o longa se livra dos moralismos em relação à bebida e expressa o máximo de perspectivas possíveis sobre os assuntos abordados. Essas perspectivas oscilam entre gerações, rodeando a relação entre os professores e seus alunos, confrontando seus métodos de ensino. Apesar de fazer menções à postura política europeia em relação às bebidas, o filme traz um contexto interno da Dinamarca, valorizando e explorando ao máximo essa cultura.

O álcool em diferentes perspectivas, a vida em alta intensidade

No geral, Another Round (2020) tem muito a dizer sobre bebidas alcoólicas, com uma visão muito honesta que não se perde da naturalidade e estética marcante do cinema dinamarquês. Os momentos de brilho e as cargas emocionais resultam na brilhante atuação de Mads Mikkelsen, que leva seu potencial ao extremo – chegando até a dançar. No entanto, o filme respira e apresenta um desenrolar aberto, propício para a reflexão carregada pelos diálogos e citações do roteiro.

Por fim, o novo filme de Thomas Vinterberg é um suspiro aliviado para as produções cinematográficas de 2020, além de ser uma mensagem de afirmação da vida, celebrando esse prazer saudoso que já se perdeu em meio à pandemia. Todo o conjunto do filme é balanceado e proporciona uma experiência que nos motiva a refletir sobre diferentes faces de um mesmo assunto, mas também nos entretém em grande parte de sua duração. Misturar álcool, filosofia, cultura europeia e Mads Mikkelsen mostrou-se a fórmula para esta obra bem captada, que inicia com uma ideia de tese e finaliza em uma expressão de vida.  

Jornalista, especialista em Metafísica e Epistemologia (UFCA) e Filosofia e Autoconhecimento (PUCRS). Sou apaixonado por cinema, filosofia, música e literatura. Confluo essas áreas na escrita das minhas críticas.

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