Análises
Análise | Como é bom estar de volta com Ghost of Tsushima: Iki Island
Se alguém me dissesse semanas antes do lançamento que Ghost of Tsushima viria a se tornar um dos meus jogos favoritos de 2020, eu certamente iria rir da cara dessa pessoa. Não que eu duvidasse da qualidade do título ou da competência da equipe da Sucker Punch, mas num mercado inflado com jogos de mundo aberto pouco inspirados e que a todo momento reutilizam conceitos ultrapassados desse gênero, era normal eu ter um pé atrás.
Mas hey, a vida está sempre nos surpreendendo, não é mesmo? O game não só traz uma campanha redondinha e muito competente, mas um mundo aberto cheio de alma e carisma. Portanto, comemorei o anúncio da expansão de Ghost of Tsushima com muito entusiasmo – ainda que anunciado de maneira péssima pela Sony ao inserir tudo num nome duvidoso como “Director’s Cut“ – e, apesar de estar um pouco atrasado, nunca é tarde para revisitar a ilha de Tsushima mais uma vez. Ou melhor dizendo, conhecer o que nos espera na ilha Iki.
Ainda que seja uma análise curta, aproveitarei o momento não só para apresentar as qualidades e defeitos da expansão, mas demonstrar também o que faz Ghost of Tsushima ser um jogo tão encantador. Então, sem mais delongas, sejam bem-vindos à Ilha Iki. Você não vai mais querer sair depois de desembarcar.
Novos amigos, velhos problemas
O anúncio de que a Ilha Iki traria um foco maior na relação entre Jin e seu pai, Kazumasa, foi um dos meus maiores atrativos em relação à expansão. No jogo base, sabemos que o jovem Jin testemunha a morte do Lorde Sakai e culpa-se por esse trágico acontecimento, mas a própria natureza do enredo impede que tal relação seja aprofundada mais à fundo, visto que o foco maior é na transformação de Jin como O Fantasma e seu conflito de ideais entre seu tio, Lorde Shimura.
Mas é quando uma nova ameaça mongol vinda de Iki promete comprometer ainda mais a guerra em Tsushima, temos essa oportunidade de ver esse lado pouco explorado do passado de Jin, afinal, a ilha Iki é nada menos que o local onde Kazumasa foi morto. Tendo que enfrentar seu próprio passado engolido pela culpa, Jin parte para ilha Iki e dá de cara também com seu maior inimigo até então: Ankshar Khatun, também mais conhecida como “A Águia”
O papel da Águia na campanha da Ilha Iki é fazer Jin reviver os traumas de seu passado, e até mesmo do presente, através de alucinações causadas por um veneno desconhecido. Tanto nas missões principais como nas secundárias, a Águia vai acompanhar o samurai a todo o momento com o intuito de manipular sua mente ao associar o presente com as memórias das batalhas e mortes causadas pelo exército Sakai durante a invasão à ilha.
Ainda claramente atormentado não só por não conseguir salvar seu pai, mas também como alguns de seus amigos introduzidos na história principal, essa dinâmica entre gameplay e narrativa é muito bem introduzida durante a curta duração dessa expansão, assim como também compõe os melhores momentos da campanha como um todo ao dar uma carga mais dramática às escolhas que Jin fez ao longo de sua jornada quando jovem e agora adulto. Logo, é bem mais interessante jogar a Ilha Iki após terminar o jogo base, pois são esses importantes detalhes que agregam ainda mais na construção de Jin como protagonista.
Porém, como mencionado acima, a campanha na ilha é curtíssima, podendo ser finalizada ainda no mesmo dia quando focada inteiramente nela e ignorando todo o conteúdo opcional (por favor, não faça isso). Se por um lado a construção de personagem do jovem Lorde Sakai é o ponto alto da jornada, o mesmo não pode ser dito da nova vilã e de Tenzo, membro de uma gangue de piratas em conflito com os mongóis e também um personagem chave na história. A Águia, apesar de possuir presença e uma postura intimidadora, – às vezes até mais que Khotun Khan – passa a maior parte do tempo ausente em pessoa dos acontecimentos das missões, e tendo uma rápida e abrupta resolução no fim da história. Tenzo, por outro lado, foi a minha maior decepção até o momento, e por motivos de spoilers, não poderei entrar em maiores detalhes, mas ficará evidente que seu papel poderia ter tido mais impacto uma vez que você entende o porquê dele estar presente na jornada de Jin.
Acredito que uma duração maior seria muito mais benéfica para a construção desses personagens, e até mesmo para aprofundar um pouco mais da história e das mitologias japonesas inseridas dentro da tribo da Águia. Certamente agregaria mais a construção de mundo dentro do universo do jogo como um todo, mas uma pena que tal oportunidade foi deixada de lado por conta do tamanho da campanha.
Uma beleza intocada pela guerra
Se Ghost of Tsushima já nos presenteava com um mapa caprichado e um dos visuais mais bonitos já vistos na história dessa indústria, a ilha Iki consegue ser tão bela quanto. A variedade dos biomas em Iki fez com que meus olhos brilhassem assim que desembarquei na ilha, e o fato do arquipélago ainda se manter distante dos conflitos com os mongóis presentes em Tsushima só ajudou a realçar ainda mais a beleza desse local.
Dentro de um mapa tão bonito, voltam em grande quantidade as diversas atividades presentes no jogo base, mas com direito também a outros conteúdos novos, suficientes para ocupar as nossas mentes por mais de 10 horas e nos apresentar um pouco mais sobre a cultura e mitologia japonesa.
Mesmo pegando emprestado diversas influências de jogos do gênero como Breath of the Wild e The Witcher 3: Wild Hunt, tanto o jogo base quando a Ilha Iki ainda tropeçam no que se diz ao design de seu mundo aberto, mas compensam completamente por fugirem de fetch quests tediosas e atividades secundárias sem qualquer ligação com o contexto de seu universo. Nisso, a equipe da Sucker Punch acertou em cheio quando se trata de nos transportar para o período Kamakura, do Japão feudal.
Os conteúdos inéditos trazem novos conjuntos de armaduras e pinturas, sidequests, além de atividades mais simples como desafios de arco e flecha, mas o que realmente se destaca aqui são os dois novos complementos dedicados a trabalhar a conturbada relação de Jin com seus pais: Os santuários de animais e as Memórias de Kazumasa. Estas duas novas atividades secundárias presentes na expansão são as melhores adições dentro do mundo aberto de Ghost of Tsushima, e não só por trabalharem ainda mais nos conflitos do jovem samurai, mas também por unirem a narrativa com momentos de contemplação visual. Impossível não terminar essas linhas de sidequests com o coração aquecido depois de ver Jin finalmente conseguir encontrar sua paz interior – e com direito a muitos cafunés em gatinhos pelo caminho.
O conteúdo secundário, mais uma vez, demonstra o comprometimento da desenvolvedora ao entender e respeitar um capítulo importante, porém desconhecido, na história do Japão. Essa união entre interatividade e contexto histórico continua sendo um dos elementos mais encantadores na expansão, e certamente, é o que fez tantos jogadores se encantarem com o jogo principal em 2020.
Veredito
Dá pra fazer carinho nos gatinhos. Você acha mesmo que eu tenho coragem de não recomendar um jogo desses??
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Ok, brincadeiras à parte. Ainda que se atropele na curta duração e alguns elementos de mundo aberto um pouco repetitivos, é impossível não recomendar a Ilha Iki para todos que amam Ghost of Tsushima. É conteúdo de sobra para matar aquela saudade dos vastos campos abertos que abrigam muitos contos e histórias interessantíssimas que iremos encontrar pelo caminho. E num período tão turbulento que o nosso mundo se encontra, um pouco de paz de espírito que Jin Sakai e o universo de Ghost of Tsushima oferecem é sempre muito bem-vinda.