Nessa terça (19) a Walt Disney Company anunciou a finalização da histórica aquisição dos ativos da 20th Century Fox por $71,3 bilhões. Com isso, a Disney passa a ser dona de todo o acervo cinematográfico e televisivo da 20th Century Fox, incluindo as franquias X-Men e Quarteto Fantástico, o filme Guerra nas Estrelas (ou Star Wars Episódio IV – Uma Nova Esperança) , cuja posse George Lucas cedeu para o estúdio em 1976, além de Avatar, Os Simpsons, Futurama, o estúdio de animação Blue Sky, criador da franquia Era do Gelo e toda a National Geographic. A partir de agora, a industria do entretenimento nunca mais será a mesma.
Rumores em 2017 indicavam que a Fox, sob o comando do magnata Rupert Murdoch, estaria ofertando a venda de todo o seu império midiático, com a exceção da rede de notícias Fox News, que seria seu total foco após a compra. A Disney, por iniciativa do CEO Bob Iger, estava sempre a principal candidata para a aquisição. Depois de longos meses de negociação, incluindo ter que cobrir duas propostas da Comcast e cumprir com exigências de antitrust do governo americano, o acordo foi selado entre os acionistas de ambas em 27 de julho de 2018. O ultimo empecilho foram regulamentos antitrust no Brasil e México, que foram atendidos após a venda de alguns canais pagos.
A aquisição se deve em grande parte à Disney querer expandir seus serviços online, em especial o serviço de streaming Disney+. Com o declínio da TV por assinatura e o sucesso estrondoso da Netflix, a as subsequentes iniciativas de entretenimento on-demand das gigantes de tecnologia como a Apple e Google querendo entrar nesse mercado, a multinacional precisa de um produto que bata de frente com esses novos competidores. Logo, todo um acervo de um dos estúdios mais antigos de Hollywood já é um grande passo nessa direção. A plataforma de streaming já tem diversos projetos confirmados, como a série de Star Wars O Mandaloriano e uma protagonizada pelo personagem Cassian Andor, séries da Marvel protagonizadas por Loki, a dupla Falcão e Soldado Invernal, o casal Feiticeira Escarlate e Visão, além de filmes live-action de A Dama e o Vagabundo e A Espada Era a Lei e uma série animada de Monstros S.A..
Mas uma aquisição desse porte vem com consequências. Analistas preveem mais de 4000 demissões para funcionários “redundantes”, ou seja, posições na Fox que já têm um equivalente na Disney, devido ao fato de estarem absorvendo uma empresa no mesmo ramo. A transição será gradual, sendo que muitas dessas demissões podem ocorrer meses após a compra. Uma baixa imediata foi a divisão Fox 2000, comandada por Elizabeth Hadler. Essa divisão era especializada em filmes de orçamento médio para públicos alvos alternativos, como Clube da Luta, Com Amor, Simon, Estrelas Além do Tempo, O Diabo Veste Prada e A Culpa é das Estrelas. Os executivos Chris Aronson e Andrew Cripps, responsáveis pela distribuição doméstica e internacional, respectivamente, da 20th Century Fox, foram notificados de suas dispensas nos próximos 60 dias. A única boa notícia é que todos os demitidos nesse processo receberão seguro-desemprego.
Outra consequência é que isso dá à Disney ainda mais dominância de mercado. Se antes ela já era dona de duas das franquias mais rentáveis do cinema (Marvel e Star Wars), agora ela é incomparável enquanto império midiático. Essa quantidade de poder permite que ela exerça uma influência sem precedentes na indústria. As mudanças propostas no Oscar deste ano foram em grande parte por pressão da Disney, para ampliar sua presença nas premiações. E com a Disney lançando tantos filmes e franquias novas por ano, eles ganham posição para exigir mais aos exibidores, coisas como número mínimo de salas, quais trailers exibir e a porcentagem das vendas. No Brasil, diversas exibidoras chegaram a boicotar o filme Viva: A Vida é Uma Festa após a Disney propor uma divisão de 48/52 na repartição da bilheteria. Esse tipo de pressão leva os exibidores a acatar propostas desvantajosas com medo de perder público, e quem acaba pagando por isso é sempre o consumidor.
A consequência final disso é que, com um estúdio a menos, agora menos filmes vão ser produzidos, e serão muito mais franquias, continuações e adaptações e muito menos filmes originais. Com menos concorrência, há menos necessidade de sair de uma zona de conforto, e portanto, menos variedade. Porque a Disney investiria em um filme menor de um artista pouco conhecido como O Ódio que Você Semeia quando pode fazer mais um spin-off de Star Wars, ou emplacar um novo super herói da Marvel? No fim, um estúdio veterano de cinema acaba como o conhecemos e outro fica cada vez maior, e o cinema perde muito mais do que ganha com isso.
Mas pelo menos agora o Hulk vai poder lutar contra o Wolverine.