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Crítica | The Long Goodbye

Cinema

Crítica | The Long Goodbye

Com uma estética inventiva e sólida, a obra-prima de Robert Altman, The Long Goodbye (1973), completa seus 50 anos.

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Completaram-se 50 anos do lançamento de The Long Goodbye (1973), longa dirigido por Robert Altman e uma adaptação do livro The Long Goodbye (1953), de Raymond Chandler. Falar deste filme não é como falar sobre qualquer outro, pois é um dos meus favoritos, uma obra pertinente em sua aura cult e que influencia o cinema até hoje. Essa revisita, com respeito e criticismo, visa esmiuçar um pouco os seus fundamentos e retomar os seus aspectos que perduraram diante do tempo.

Um clássico literário moderno reinventado para as telas  

The Long Goodbye (1973) conta a história de Philip Marlowe (Elliott Gould), um detetive particular que ajuda seu amigo, Terry Lennox (Jim Bouton), a fugir para o México. Posteriormente, descobre que a esposa de Lennox foi assassinada, e que ele se suicidou. Uma premissa de investigação instigante, mas fora da curva, que se dissemina num tom constante de despedida e negação melancólica de Marlowe. Aqui, o grande desafio é adaptar para as telas – e atualizar para os anos 70 – uma obra literária ambientada na década de 50.  

A adaptação do livro é renovada pela forma como Altman coloca a figura icônica e moral de um detetive dos anos 50 no contexto contracultural da Los Angeles dos anos 70, abrindo espaço para reescrever essa história com cinismo e ironia. Ele reconfigura uma trama, entrelaçada e que beira a entropia, sem perder a essência original da obra – o fato de Altman não ter lido todo livro ajuda nesse processo. Assim, o diretor desmembra um clássico literário moderno para criar um filme à altura. 

“It’s okay with me”. Philip Marlowe

Na minha visão, esse desmembramento consagra The Long Goodbye (1973), abrindo mão da sua raiz literária e criando méritos atemporais e imagéticos, que se constituem justamente dessa unidade estética criada através dos seus elementos inventivos que operam em conjunto. Assim, forma-se um imaginário da Los Angeles dos anos 70, que até hoje tenta ser simulada por diferentes realizadores – mais recentemente em Vício Inerente (2015) e Licorice Pizza (2021), de Paul Thomas Anderson, de quem Altman era mentor. 

Philip Marlowe procurando a ração preferida do seu gato.

As alcoólicas doses estéticas de The Long Goodbye

A figura de Marlowe, descolada e irônica, funciona como sátira ao gênero noir, deixando para trás aquela pose heroica e necessária do Philip Marlowe (Humphrey Borgart), de The Big Sleep (1946), adaptação de outro livro de Chandler. Sua personalidade é desinteressada e solitária, preocupando-se apenas com seu gato – que desaparece –, e com a ausência de qualquer responsabilidade no caso de Terry Lennox, do qual se aliena constantemente. Seu caráter parece estar suspenso em um limbo, no qual divaga com bom humor.  

Entre fósforos acesos em todos os tipos de superfície, Marlowe encontra – ao acaso – diferentes personagens caricatos, satíricos, numa espécie de abandono narrativo de um sentido causal. É apenas um retrato do detetive, envolto em novos trabalhos e ameaças constantes, em uma realidade que não detêm nexo. Destes personagens, o mais emblemático é Roger Wade (Sterling Heyden), sendo uma ode a todos escritores alcóolatras, como Ernest Hemingway e Scott Fitzgerald – e até o próprio Chandler.  

Nesse caminho neo-noir – e quase niilista – que o filme assume, os singulares elementos técnicos que o moldam trazem robustez e coerência para o seu universo. É o caso da música tema de John Williams, que é tocada em diversos momentos, em versões que vão do jazz ao hino fúnebre – e ao som de campainha; assim como a cinematografia de Vilmos Zsigmond, mantendo a câmera em movimento o tempo todo e se arriscando em uma percepção visual voyeurística, que contribui para o mistério enquanto atmosfera.

A forma como os reflexos são utilizados é uma das melhores do cinema nessa década – e é um claro resquício de Images (1972), filme anterior de Altman. Destaque para quando Roger Wade e Eileen Wade (Nina van Pallandt) estão discutindo, e no reflexo do vidro aparece Marlowe passeando na frente das ondas do mar. As cenas da praia contribuem nesse imaginário referencial que o filme cria, com a areia clara e a força de um mar dotado de perigo.

Roger Wade e Philip Marlowe tomando um drink na praia.

Um longo adeus e um extenso legado 

Nessa unidade sólida que The Long Goodbye (1973) constrói, numa sátira às tramas de investigação e a própria carência de valores que constituem seu contexto, é marcante como o sentido é retomado, sendo estilisticamente – tanto quanto narrativamente – conclusivo. Seu pretexto é encarado como certeza, mas se engana através do olhar de um detetive propenso ao erro – as bases psicológicas de Marlowe estão mais presentes no livro, sem dúvidas.  

No entanto, desde a perda do seu gato, o vazio de Philip Marlowe se torna um destino quase natural para uma resolução, que decorre em um recorte que se arrisca e é inventivo em sua forma. É essa inovação estética que revigora a figura decadente e desgastada do detetive representada em Philip Marlowe que, na contraditória humanização inerente ao seu desinteresse, consegue preservar seu charme em uma última bala. 

Jornalista, especialista em Metafísica e Epistemologia (UFCA) e Filosofia e Autoconhecimento (PUCRS). Sou apaixonado por cinema, filosofia, música e literatura. Confluo essas áreas na escrita das minhas críticas.

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