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Crítica | Decisão de Partir

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Cinema

Crítica | Decisão de Partir

Longa sul-coreano conflui romance e mistério em um trabalho excepcional do diretor Park Chan-wook.

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Dentro da filmografia do Park Chan-wook, costumo pensar na divisão entre os seus trabalhos consagrados, como Oldboy (2003) e The Handmaiden (2016), e os filmes que entraram num grupo de menor destaque, como I’m a Cyborg, But That’s Ok (2006) e Thirst (2009). Porém, Decisão de Partir (2022), que teve sua pré-estreia nos cinemas no dia 29 de dezembro – e levou o prêmio de melhor direção no Festival de Cannes de 2022 –, parece tomar um outro caminho que desvirtua dessa mera divisão ilustrativa da trajetória do diretor.

Na verdade, esse aparenta ser o título mais balanceado do cineasta nesse sentido. A forma como seus simulacros narrativos são utilizados contrasta perfeitamente com um romance misterioso – de caráter neo-noir – que beira uma inocência supostamente boba sobre um detetive policial, Hae Joon (Park Hae-il), que se apaixona por uma mulher chinesa, Seo-rae (Tang Wei) – suspeita de assassinar seu marido. 

Decisão de Partir retrata uma perversão um tanto elegante 

A ideia de comprar o desenrolar desse “romance” se difere dos filmes de menor destaque do diretor, porque aqui a experiência é mais intuitiva, intimista e equilibrada até nas bizarrices escrachadas que são sua marca. Claro que isso é facilitado pelas atuações bem executadas de Park Hae-il, em seu personagem obcecado por crimes – que não consegue dormir –, e Tang Wei, que performa brilhantemente uma personalidade cheia de desenvolturas – com destaque para as menções à história e cultura chinesa na construção de Seo-rae.

“O homem sábio admira o mar, o homem gentil admira as montanhas”. Confúcio  

Essa sinergia no desenvolvimento dos dois personagens parece ganhar um outro patamar pela sofisticação de Park Chan-wook. A cinematografia, digna de uma grande produção, incorpora as características marcantes do seu cinema, como as cenas em ângulo holandês ou em travelling, numa movimentação constante que nos transporta rapidamente – e de forma sutil – de um foco ao outro. A edição passeia em cortes rápidos, que jogam com a própria temporalidade e com o estado psicológico dos protagonistas.

Seo-rae parada em frente a uma parede de textura azul pintada como o mar

É válido mencionar o nível de detalhamento da fotografia, e como o trabalho de cores e iluminação agrega uma coerência que em certos momentos, pela beleza das imagens, nos distrai de qualquer propósito existente. Além disso, o trabalho de som é pontual, principalmente nas trilhas e nos efeitos sonoros – estes nos remetem àquela violência abrupta que é retomada constantemente nas obras de Chan-wook.

Uma produção atual com uma breve visita ao passado 

Embora tenha essa roupagem moderna, um ponto que vale ser observado é como a construção do longa – em alguns momentos – nos remete aos clássicos, como Rear Window (1954) e Vertigo (1958) do Hitchcock – e em certo ponto ao Brian De Palma, pelo maneirismo na montagem das cenas. São referências bem integradas no filme, que no vigor de sua atualidade se apropria do voyeurismo e da perspectiva vertiginosa na altura dos seus prédios. Ainda assim, essas breves alusões não ofuscam em nada o autorismo do diretor sul-coreano.

Seo-rae olhando para Hae Joon

Decisão de Partir (2022) é uma experiência cuidadosa, misteriosa e surpreendente em suas camadas. Em seus 138 minutos, provamos do romance improvável, carregado pontualmente com a perversão e a violência intrínseca de Hae Joon e Seo-rae, e compreendemos essa relação através dos significados ocultos nessa intimidade, seja nas falas enigmáticas ou nos gestos caricatos. Tudo é realizado em um alto grau de sofisticação do diretor Park Chan-wook, que respira brevemente entre os cortes dinâmicos para nos trazer as emoções e surpresas já (in)esperadas em seus melhores títulos.

Jornalista, especialista em Metafísica e Epistemologia (UFCA) e Filosofia e Autoconhecimento (PUCRS). Sou apaixonado por cinema, filosofia, música e literatura. Confluo essas áreas na escrita das minhas críticas.

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