Distribuído pela Netflix, Mank é o novo longa-metragem do diretor David Fincher, responsável por filmes aclamados como A Rede Social (2010), Clube da Luta (1999) e Seven (1995). Também responsável pelo seriado Mindhunter, o diretor encontra neste novo título uma “fuga” da produção da série, e entra em fluxo com um interesse antigo de seu pai, Jack Fincher, jornalista e crítico de cinema que era fascinado pelo roteirista Herman J. Mankiewicz, também conhecido como Mank — interpretado por Gary Oldman.
Distribuído pela Netflix, Mank é o novo longa-metragem do diretor David Fincher, responsável por filmes aclamados como A Rede Social (2010), Clube da Luta (1999) e Seven (1995). Também responsável pelo seriado Mindhunter (2017-2019), o diretor encontra neste novo título uma “fuga” da produção da série, e entra em fluxo com um interesse antigo de seu pai, Jack Fincher, jornalista e crítico de cinema que era fascinado pelo roteirista Herman J. Mankiewicz, também conhecido como Mank — interpretado por Gary Oldman.
Alcoólatra, mas brilhante em seus roteiros, Mank foi responsável por roteirizar Cidadão Kane (1941), filme dirigido por Orson Welles e considerado um marco na história do cinema. É neste contexto que Mank se passa, revelando diversas analogias que Cidadão Kane faz com a realidade e desvendando muitas influências da obra. Portanto, é mais do que necessário assistir Cidadão Kane para compreender Mank em sua totalidade.
Mank acontece num ritmo rápido, com informações jogadas para todos os lados, deixando o espectador propositalmente perdido e mergulhado no contexto da indústria cinematográfica estadunidense da década de 30. O filme vai fundo na história do cinema, e emoldura o personagem Mank, excêntrico, bem-humorado e controverso, no período de escrita do roteiro de Cidadão Kane.
Ao mesmo tempo que fora internado para focar na produção — por conta de seu alcoolismo e vicio em apostas — , Mank faz suas saídas esporádicas, gerando influência e conflito com seu ponto de vista político, completamente crítico ao personagem William Randolph Hearst (Charles Dance), empresário e magnata, dono de diversos jornais — em quem o personagem Charles Foster Kane é inspirado.
Neste sentido, Mank traz um recorte bem específico do tempo, permitindo que Fincher passeie por uma confecção biográfica com elementos ficcionais, como feito dez anos atrás com A Rede Social. Mas neste caso os diálogos são ainda mais ligeiros, carregados de informações e referências, sendo um filme denso para quem não conhece Cidadão Kane nem o contexto no qual foi produzido. Sendo assim, o longa retrata e reinterpreta os elementos de sua história que foram colocados posteriormente no filme de Welles, e faz isso através do seu visual preto e branco, com cenas específicas representadas de forma muito similar à Cidadão Kane.
Além disso, os personagens secundários tem potencial mas não chegam à brilhar, pois todos se curvam às críticas e sátiras de Mank. Apenas a personagem Marion Davies (Amanda Seyfrield) recebe um bom destaque pelo seu papel, sendo uma amizade importante pro protagonista. Até o próprio personagem de Orson Welles (Tom Burke) permanece em boa parte nas sombras.
A história apesar de rica em detalhes, não consegue fugir de ser uma representação de algo muito maior — a vida de um homem não pode ser resumida em uma palavra. Portanto, não há reviravoltas clássicas do Fincher, nem nada disso. É um projeto muito mais específico e com uma proposta peculiar, mesclando um desafio tomado pelo diretor com a pesquisa feita pelo seu pai, falecido em 2003. Assim o filme encontra sua personalidade própria, representando bem o fim dos anos 30, e é pontual em suas críticas políticas e sociais, revelando a visão ampla de Mank sobre os assuntos que fariam parte de sua criação de roteiro — no qual parte de seus demônios também são incorporados.
A trilha sonora e os cenários de Mank são dignos de atenção, as atuações também embora todos personagens secundários sejam absolutamente iguais e indistinguíveis por conta das vestimentas. Mas no fim, o que brilha em Mank é a relevância dos assuntos que aborda, porque o filme pode ser bem detestável à quem não se interessa pela sua proposta, resultado de Fincher voltando ao estilo biográfico e indo de encontro ao roteiro do seu pai. O resultado final tem valor, mas não é brilhante como outros trabalhos do diretor. Mank é um filme acima da média para 2020, que resgata a história do cinema de forma espessa e crítica, enquanto volta seus olhos para um roteirista criativo, problemático e questionador.
Jornalista, especialista em Metafísica e Epistemologia (UFCA) e Filosofia e Autoconhecimento (PUCRS). Sou apaixonado por cinema, filosofia, música e literatura. Confluo essas áreas na escrita das minhas críticas.