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Ahsoka – Um presente a quem nunca desistiu de Star Wars
Ahsoka vem a nós após anos de espera, como uma sequência dos eventos mostrados na série The Mandalorian, mas também, continuando a história da animação Star Wars Rebels. A personagem surgiu no filme animado de The Clone Wars, de 2008, que inicialmente não agradou os fãs com sua personalidade forte e “abusada”.
Ainda na primeira temporada da animação subsequente, seu caráter é desafiado e a personagem começa seu processo de amadurecimento. Com o tempo ela se tornou amada, principalmente com seu crescimento e evolução nítidos para o espectador, protagonizando momentos grandiosos da saga Star Wars nas animações, e agora, em live action.
Protagonizada por Rosario Dawson, o enredo segue Ahsoka na luta para impedir o retorno de um antigo líder militar imperial, o Grande Almirante Thrawn, vivido por Lars Mikkelsen. Com a ajuda de Hera Syndulla (Mary Elizabeth Winstead) e do droid Huyang (David Tennant), Ahsoka se reúne com sua antiga aprendiz Sabine Wren (Natasha Liu Bordizzo), que também deseja reencontrar seu amigo Ezra Bridger (Eman Esfandi), desaparecido junto ao Thrawn.
Escrita por Dave Filoni, co-criador da personagem ao lado de George Lucas, e dirigida por grandes nomes da TV, a produção é comandada com extremo cuidado, uma atenção que se perdeu nas produções da franquia. Ahsoka considera a dedicação de fãs que acompanham a saga em diversas mídias, como uma convergência de universos, onde, aqui, tudo faz sentido. Jogos, séries, quadrinhos, livros, animações, tem um pouco de cada, e quanto mais conhecer, maior a recompensa. Porém, essa atenção que serve como presente para o fã pode facilmente se tornar uma arma contra a própria série.
Felizmente, o maior problema da produção não me atingiu, na verdade, foi uma alegria inexplicável, mas para outros espectadores, imagino somente confusão. O roteiro não se importa com o público casual, em nenhum momento os eventos anteriores são explicados, tudo que a audiência pode fazer é pescar detalhes nos diálogos e pesquisar no Google mais tarde.
Quem não viu Rebels, principalmente, não faz ideia do sacrifício de Ezra Bridger ou qual o nível de periculosidade do Thrawn. O enredo conta com a ideia de que o público já saiba disso, o que deve afastar novos espectadores, e até alguns que já conhecem a franquia mas não são assíduos.
Apesar disso, a obra deve encher os olhos do público, casual ou não, com grandes batalhas espaciais e ótimas coreografias de sabres de luz. Ponto que para mim foi especial, acredito que as batalhas de sabre nunca foram tão bem trabalhadas e precisas. Não parecem aleatórias e sem beleza como nas sequels, nem parecem cheias de giros e floreios como nas prequels, em Ahsoka, cada golpe é preciso e fatal, cada defesa é essencial para a integridade dos personagens.
Durante as batalhas, principalmente em episódios dirigidos por Dave Filoni, as câmeras abertas tomam conta, colocando os protagonistas do duelo em perfil se enfrentando, como um jogo de luta. A base de Dave são as lutas samurais de Akira Kurosawa, e essa máxima se repete ao decorrer da série em quase todos os duelos, que pra mim, são os melhores desde a Vingança dos Sith.
O quarto episódio, intitulado “Fallen Jedi”, representa toda a qualidade da produção. O episódio funciona como um encerramento do primeiro arco e por si só ele tem a mesma arquitetura de um filme da franquia. O capítulo carrega drama, um desafio, batalhas magníficas, revelações e uma reviravolta pessimista. Se Ahsoka pode ser chamada de Império Contra-Ataca das séries de Star Wars, esse episódio é o Império Contra-Ataca de Ahsoka.
Para a expansão do universo Star Wars, nada desde Rebels foi tão significante quanto Ahsoka. Um novo universo de possibilidades literalmente se abriu diante de nós, novos mundos, raças, lendas, magias, histórias. A história segue a mesma receita de Rebels, fazendo parecer que os filmes da franquia são insignificantes comparados à magnitude dos eventos cósmicos mostrados nas produções de Dave Filoni. Para alguns, isso pode diminuir o peso da trilogia original, e de fato, faz sentido, mas acredito que a expansão e a busca por novas e boas histórias só acrescentam à franquia. Já que a história faz tanta referência a Tolkien, é como dizer que O Senhor dos Anéis perdeu peso ao sabermos como foi a Guerra da Ira em O Silmarillion.
Falando em Tolkien, Dave Filoni buscou na literatura e lendas europeias boa parte das inspirações para a obra. Marrok, o cavaleiro transformado em lobo pela bruxa Morgana nas lendas arturianas. Skoll e Hati, lobos filhos de Fenrir, da mitologia nórdica. Além disso, Filoni fala assumidamente sobre sua inspiração no mago Gandalf de O Senhor dos Anéis para o desenvolvimento da própria Ahsoka. Assim como em A Sociedade do Anel, aqui vemos a protagonista batalhar contra um demônio de tempos antigos numa ponte que se quebra, caindo, mas retornando mais poderosa e sábia do que antes, como Gandalf, O Branco.
Apesar de não confirmada, a produção claramente carece de uma segunda temporada, que não deve demorar a ser confirmada. Os eventos ficaram pela metade, e mesmo com um filme a caminho que deve finalizar toda essa saga, muita coisa precisa ser resolvida e esclarecida antes desse momento final. As piscadelas para um arco envolvendo deidades da força podem ser perigosas, muito porque é um núcleo protagonizado por Ray Stevenson, intérprete de Baylan Skoll, que faleceu antes da estreia da série. Fica a questão se a Disney vai tentar um recast, usar deepfake, ou simplesmente esquecer essa parte da história.
Ahsoka realmente reacendeu a chama de Star Wars no coração de diversas pessoas. Andor trouxe um acalento técnico para a franquia, com muito primor, mas uma interpretação muito particular desse universo. Ahsoka entregou Star Wars em toda sua magnitude, algo que fãs de todas as versões dessa franquia podem aproveitar. Sabres, naves, diálogos, tudo remete ao que George Lucas idealizou e pôs em prática, consolidando Dave Filoni como maior mente criativa por trás da Lucasfilm.